Não teremos dias para os "gostinhos" e devido a vida movimentada na Nightshade, pode até acontecer publicar-se este capítulo=gostinho e mais nenhum.
Digo e repito! NÃO será uma tradução completa do livro, mas sim capítulos que mais chamaram a atenção da nossa colega.
Vamos lá, esperemos que gostem.
Legado da Adaga Negra
Beijo de Sangue
Capítulo 1
Casa de Audiências do Rei, Caldwell, Nova Iorque
Algumas graduações aconteciam em privado.
Alguns desses marcos importantes da próxima fase da vida
não tinham nem chapéus, nem capas académicas, não tinham uma orquestra a tocar
com pompa e circunstância. Não havia palco para atravessar ou diploma para
pendurar na parede. Não havia testemunhas.
Algumas graduações eram marcadas pela simplicidade do
quotidiano, o «nada de especial», como uma pessoa a carregar no pequeno botão
azul do canto inferior direito de um ecrã de computador da Dell. Uma acção mundana feita muitas vezes numa semana, num mês,
num ano, mas que, numa instância em particular, uma grande divisão entre o
antes e o depois de uma ocorrência.
Enquanto Paradise, filha de sangue de Abalone, Primeiro
Conselheiro de Wrath, filho de Wrath, pai de Wrath, Rei de todos os vampiros,
se recostava na sua cadeira de escritório, ela olhava para o ecrã, agora negro,
que estava à sua frente. Incrível. A noite porque tanto esperou estava quase
aí.
Na maioria das últimas oito semanas, o tempo havia
passado devagar, mas nestas últimas duas noites, as coisas tinham sido mudadas
e viradas para modo de catapulta. De repente, depois de ter sofrido sete mil
horas à espera que a lua subisse, ela sentia-se como se quisesse que as coisas
abrandassem novamente.
O primeiro emprego dela era agora coisa do passado.
Olhando através da secretária, ela muda de sítio o
telefone da secretária um centímetro… depois, coloca-o novamente aonde tinha
estado. Ela endireita a libelinha de vitral do candeeiro Tiffany. Confere se as canetas azuis estão num compartimento e as
vermelhas no outro. Passa a sua palma pelo mata-borrão livre de pó e o topo do
monitor.
A sala de espera estava vazia, as cadeiras de seda
desocupadas, as revistas colocadas em ordem nos lados das mesas, as bebidas
servidas pelos doggen para aqueles
que haviam aparecido todas limpas.
O último civil tinha saído cerca de trinta minutos atrás.
O amanhecer chegaria dentro de duas horas. No fim de tudo, era um final normal
de uma noite de trabalho árduo, tempo de ela e o pai voltarem para casa para
desfrutarem de uma refeição cheia de conversa e planos e respeito mútuo.
Paradise inclinou-se para a frente e olhou em volta das
arcadas da sala de espera. As portas duplas, onde dantes davam entrada ao que
tinha sido a sala de jantar da mansão, estavam fechadas.
Sim, apenas uma noite normal, excepto pela não-normal
reunião que ali estava a acontecer: Logo após a saída do último civil, o seu
pai havia sido chamado para o gabinete de audiências e aquelas portas haviam
sido fechadas.
Ele encontrava-se ali com o Rei, e dois membros da
Irmandade da Adaga Negra.
- Não faças isso comigo - disse ela. - Não me tires isto
de mim.
Paradise levantou-se e andou em redor, reendireitando as
revistas, recompondo as almofadas, parando em frente duma pintura a óleo de um
rei Francês.
Regressando às arcadas, ela olha para os painéis fechados
da sala de jantar e ouve o bater do seu coração.
Levantando as mãos, ela apalpa os calos das suas palmas.
Eles não surgiram do trabalho que fez para o seu pai e a Irmandade nos últimos
dois meses, a organizar horários e a identificar potenciais problemas,
resoluções e seguimentos dos casos. Não, pela primeira vez na sua vida, ela tem
frequentado um ginásio. A levantar pesos. A correr nas passadeiras rolantes.
Flexões, abdominais, elevações, máquina de remo.
Até à data, ela nem sabia que existiam máquinas de remo
ou o que eram.
E era tudo para a preparação de amanhã à noite.
Assumindo que aquele grupo de machos na sala de
audiências do Rei não lhe iam negar isso.
Amanhã, à meia-noite, ela é suposto juntar-se a machos e
fêmeas, que só a Virgem Escrivã sabia quantos, num local secreto, onde ela ia
tentar entrar para o programa de treino de soldados da Irmandade da Adaga
Negra.
Era um bom plano, algo que ela tinha decidido seguir, uma
oportunidade de ser independente e dar cabo de alguém e provar a si própria que
era mais do que versão de luxo. O problema? Filhas de sangue da glymera, e ainda por cima de uma das
famílias fundadoras, não treinavam para se tornarem soldados. Elas não
manuseavam armas ou facas. Elas não aprendiam a lutar ou a defenderem-se. Elas
nem sequer sabiam o que era um minguante.
Elas nem sequer interagiam com soldados.
Filhas como ela aprendiam a arte de bordar, música
clássica e canto, boas maneiras, e a comandar mansões cheias de doggen. Esperava-se que soubessem o
complicado calendário social de ciclos festivos, que se actualizassem com os
complicados requerimentos do guarda-roupa, e saberem a diferença entre Van Cleef & Arpels, Boucheron e Cartier. Elas eram acolhidas, protegidas e cuidadas como jóias.
A única coisa perigosa que eram autorizadas a fazer?
Acasalar. Com um hellren escolhido
pela sua família para assegurar a santidade das linhagens de sangue.
Era um milagre o pai dela estar a deixá-la fazer isto.
Ele, certamente, não tinha concordado quando lhe havia
mostrado pela primeira vez a inscrição, mas depois, ele havia mudado de opinião
e tinha-a deixado inscrever-se no programa: Os ataques de há dois anos atrás,
quando tantos vampiros haviam sido mortos pela Sociedade dos Minguantes, a
provarem o quão perigoso Caldwell, Nova Iorque podia ser. E ela havia lhe dito
que não queria sair e lutar na guerra. Só desejava saber como se defender.
No momento em que tinha exposto os termos da segurança
dela? Foi quando o seu pai havia mudado de opinião.
A verdade verdadeira era que ela só queria algo que fosse
dela. Uma identidade que viesse de outro lado para além do que o seu lugar de
nascimento impunha.
Mais, Peyton tinha-lhe dito que não o podia fazer.
Porque ela era uma fêmea.
Merda para isso.
Paradise olhou novamente para aquelas portas fechadas.
- Vá lá…
Andando às voltas, ela acabou por sair da sala, não
queria ficar muito perto de onde os machos se reuniam, como se isso fosse
azarar as coisas.
Deus, o que é que falavam tanto ali?
Normalmente, o Rei saía logo após a última audiência da
noite. Se ele ou a Irmandade tinham algum assunto privado ou o que fosse sobre
a guerra, tudo isso era discutido na residência da Primeira Família, um local
tão secreto que nem ela, nem o pai haviam sido ainda convidados a comparecer.
Então, sim, o que fosse tinha que ser sobre ela.
Regressando à área de espera, ela foi até à secretária e
contou as horas em que se tinha sentado ali. Ela só tinha trabalhado ali
durante dois meses, e até gostou do trabalho, até aquele momento. Na sua
ausência, assumindo que ela ficaria no programa de treino da Irmandade da Adaga
Negra, uma prima dela haveria de a substituir, e ela havia passado as últimas
sete noites a mostrar à rapariga os procedimentos e afazeres que Paradise havia
feito, fazendo com que a transição corresse de forma suave.
Sentando-se na cadeira, ela abre a gaveta do meio e tira
a inscrição dela, como se isso pudesse, de alguma maneira, assegurar de que
tudo ainda ia acontecer.
À medida que segurava no papel nas mãos, ela perguntou-se
quem mais iria estar na orientação de amanhã… e pensou no macho que havia
aparecido na casa de audiências, à procura de uma versão imprimida da inscrição.
Alto, ombros largos, voz profunda. A usar um boné de
basebol dos Syracuse, e calças de ganga tão gastas que tinham de ser de
trabalho.
A comunidade de vampiros era pequena, e ela nunca o tinha
visto antes, mas talvez ele fosse só um civil? Essa era outra mudança no
programa de treino. Até à data, só machos da aristocracia é que eram convidados
a trabalhar com a Irmandade.
Ele havia-lhe dado o seu nome, mas recusou-se a
cumprimentá-la com a mão.
Craeg. Era tudo o que ela sabia.
No entanto, ele não tinha sido mal-educado. De facto, ele
tinha-a apoiado com a inscrição dela.
Ele também tinha sido… cativante duma maneira que a tinha
chocado, de tal forma que ela esperou semanas que ele regressasse com a
inscrição. Não o fez. Talvez ele tivesse feito um scanner e enviado a coisa dessa forma.
Ou talvez, ele tinha decidido não atender ao programa.
Parecia loucura ficar desapontada por não o ter visto de
novo.
Com o telemóvel dela a tocar, ela assusta-se e vai até ao
objecto. Peyton. Novamente.
Ela iria vê-lo na orientação de amanhã à noite, e seria
breve o suficiente. Depois da discussão que tiveram por ela se juntar ao
programa, ela teve que se afastar daquela amizade.
Por outro lado, e se a Irmandade estaria a frustrar as
intenções dela com o pai? Aquela indignação justa que sentiu pelo tipo ia ser
um ponto desnecessário. Mas, vá lá, fêmeas podiam inscrever-se.
O problema era que ela não era uma fêmea «normal».
Pelo amor de Deus, ela não sabia o que ia fazer se o pai
dela recuasse na decisão. No entanto, seguramente, a Irmandade não iria esperar
até ao último momento para lhe negar um lugar.
Certo?
***
No outro lado da cidade, a shellan acasalada com o Irmão da Adaga Negra Dhestroyer, Butch
O’Neal, recostou-se na sua cadeira de escritório no Sítio Seguro. Com a coisa a
ranger, ela tamborila com a sua caneta Bic
na anotação no calendário da Empresa OfficeMax e muda o auscultador do seu
telefone para a outra orelha.
Cortando com a conversação, ela diz:
- Bem, certamente que aprecio o convite, mas eu não posso…
A fêmea no outro lado da linha não deixou escapar nada.
Ela só se limitava a falar, a sua entoação aristocrática a absorver toda a rede
telefónica - até que era de perguntar como é que o código postal da zona não
sofria um esgotamento eléctrico.
- … e pode perceber como necessitamos da sua ajuda. Este
é o primeiro festival de Baile do Décimo Segundo Mês que foi organizado desde
os ataques. Como shellan de um Irmão,
e membro de uma Família Fundadora, seria perfeita para presidir este evento…
Dando oportunidade para outro não, Marissa interrompe:
- Não sei se tem noção, mas eu trabalho a tempo inteiro
como directora do Sítio Seguro e…
- … e o seu irmão disse que seria uma boa escolha.
Marissa ficou em silêncio.
O seu primeiro pensamento foi que era muito improvável
que Havers, o médico da raça e o seu muito, muito, muito distanciado familiar
próximo, a tivesse recomendado para qualquer coisa a não ser uma morte
prematura. O segundo pensamento foi mais na linha de calcular… quanto tempo
passou desde que tinha falado com ele. Dois anos? Três? Desde que ele a tinha
expulso de casa deles, cinco minutos antes da alvorada, quando descobriu que
ela estava interessada num mero humano.
Que afinal, revelou-se ser primo de Wrath e o recipiente
para a lenda do Dhestroyer.
Como gostas de mim
agora?, ouviu-se perguntar na sua cabeça.
- Portanto, tem
que presidir o evento. - Concluiu a fêmea. Como se tivesse terminado o assunto.
- Vai ter que me perdoar. - Marissa pigarreou. - Mas o
meu irmão não está numa posição em que possa proferir o meu nome para o que
quer que seja, visto que não nos falamos há já algum tempo.
Quando mais nada a não ser um silêncio carregado surgiu
na ligação, ela decidiu que devia ter revelado a roupa suja da sua família uns
dez minutos antes: Membros da glymera
deviam obedecer a certos códigos rigorosos de conduta - e expor uma rixa
colossal na sua linhagem de sangue, apesar de ser bem conhecida, simplesmente
era uma coisa que não se fazia.
É bem mais apropriado que outros sussurrem sobre o
assunto por detrás das costas.
Infelizmente, a fêmea recuperou e mudou de táctica:
- É de importância vital, a qualquer custo, que todos os
membros da nossa classe resumem os festivais…
Uma batida na porta do seu escritório levou os olhos de
Marissa a olharem em redor.
- Sim?
Através do telefone, a fêmea disse:
- Maravilhoso! Poderá vir até a minha casa…
- Não, não. Alguém precisa de mim. - Marissa falou alto.
- Entre.
No momento em que viu a expressão no rosto de Mary, ela
praguejou. As notícias não eram boas. A shellan
de Rhage era uma profissional consumada, para ela estar naquele estado? Era um
problema sério.
Era aquilo sangue
na camisa dela?
Marissa baixou de tom e cortou a cordialidade.
- A minha resposta é não. O meu trabalho requer todo o
meu tempo. Além disso, se é assim tão apaixonada, você deveria de ficar com a
tarefa. Adeus.
Atirando com o auscultador no descanso do telefone, ela
levanta-se:
- O que é que se passa?
- Temos uma recém-chegada que precisa de cuidados
imediatos. Não consigo entrar em contacto com a Dra. Jane ou Ehlena. Não sei o
que fazer.
Marissa correu à volta da secretária.
- Onde está ela?
- Lá em baixo.
O par desceu o lanço de escadas a correr com Marissa a
liderar.
- Como é que ela veio até nós.
- Não sei. Uma das câmaras de segurança apanhou-a na
relva a rastejar.
- O quê?
- O meu telemóvel tocou com um alerta, e eu fui até lá com
Rhym. Carregámo-la até ao vestíbulo.
Contornando o canto inferior, Marissa derrapou num dos
tapetes de pêlo alto…
E parou por completo.
Quando viu as condições da fêmea que estava no sofá, ela
coloca uma mão sobre a boca.
- Oh, meu querido Deus… - Ela suspirou.
Sangue. Havia sangue por todo o lado, no chão a pingar, a
encharcar as toalhas brancas que pressionavam contra as feridas, a fazer poça
debaixo de um dos pés da fêmea na carpete.
A rapariga foi agredida de tal forma que não havia como identificá-la,
as suas feições tão inchadas, que se não tivesse cabelo comprido e uma camisa
rasgada, nem se seria capaz de saber de que género era. Um braço estava,
claramente deslocado, o membro pendurado de forma errada a partir do ombro… e
só tinha um sapato de salto alto no pé esquerdo, as suas meias rasgadas.
A sua respiração era má, muito má. Nada a não ser um
chocalho no seu peito, como se tivesse a afogar-se no seu próprio sangue.
Rhym, a supervisora, olhou através do sítio onde estava
acocorada no sofá. Através das lágrimas nos seus olhos, ela suspirou:
- Não acho que ela vá viver. Como pode viver…?
Marissa teve que se recompor. Era a única opção.
- A Dra. Jane e Ehlena, estão ambas indisponíveis? -
Disse ela com uma voz embargada.
- Tentei a mansão - replicou Mary. - A clínica. Os
telemóveis. Duas vezes em todos os sítios.
Por um segundo, Marissa ficou aterrorizada sobre o que é
que isso significaria para a sua própria vida. Estariam os Irmãos em sarilhos
médicos? Estaria Butch okay?
Isso durou apenas um momento.
- Dá-me o teu telemóvel e leva os residentes para o anexo
Wellsie. Quero todos lá para o caso de ter de chamar um macho.
Mary atirou-lhe o telemóvel e assentiu.
- Deixa isso comigo.
O Sítio Seguro era mesmo isto - um sítio seguro para
fêmeas vítimas de violência doméstica, que vêm à procura de abrigo e
reabilitação com as suas crias. E depois de Marissa passar séculos incontáveis
e inúteis com a glymera, a não ser
nada do que a prometida não reclamada do Rei, ela havia descoberto a sua
vocação aqui, no serviço daqueles que foram abusados verbal e fisicamente, e no
pior dos casos, tratados de forma horrível.
Machos não estavam permitidos de lá entrarem.
Mas para salvar a vida desta fêmea, ela iria quebrar essa
regra.
Atende o teu telemóvel,
Manny, pensou ela quando o primeiro toque soou. Atende o maldito do teu telemóvel…
*Nasan